Exposição_Pintura_Rui Paiva

DO DESENHO À AGUARELA, AO CORRER DA VIDA


Os primeiros traços de horizontes vividos são desenhados a grafite, aromas densos lidos nas costas das mãos. Mapas de selvas escondidas em bosques calcorreados de bicicletas, vulgo baskouros, velozes e conhecedores de caminhos sempre diferentes.
A ilustração junta os contornos surrealistas dos desenhos às cores de uma paleta rica em tonalidades. Porque África está na origem. África está na paleta das cores que se espraiam nos desenhos e depois nas aguarelas e mais tarde nas telas.
A Aguarela também vem de longe, desde a primeira dúzia de anos, persistente, atenta, deslizando docemente no papel, fundindo cores transparentes que soltam ritos de alegria.
A Pintura é um sopro de Vida que nasce numa longa vida feita no Continente Extremo, num Oriente de especiarias e viagens.
É em Macau, numa China distante, que nascem em 1986 as primeiras telas envolvidas cuidadosamente em suave papel de arroz e tratadas por aguadas de acrílico. A técnica é de fusão de tonalidades inúmeras, em formas que vagueiam entre o figurativo e o abstracto. É o falso abstracto que se vai impondo nas imagens construídas em paisagens do impossível, reais de tanto se esconderem na pele de quem as pinta.
Cidadão do Mundo as vivências orientais enriqueceram as texturas pictóricas, relevando em Macau e Hong Kong, num espaço de convívio com artistas chineses.
Nesta exposição no Porto, a Aguarela é o pulsar de paisagens que dialogam em feições mais realistas ou mais abstractas, um pouco como os sonhos que se nos deparam numa vida de sentidos tão díspares, numa sociedade globalizada no improviso.
Rui Paiva (2007)

Exposição "Do desenho á aguarela, ao correr da vida", de 15/XII/2007 a 19/I/2008

Sem comentários:

FOUND IN TRANSLATION


"Recém-chegado e ignorando completamente as línguas do Levante, Marco Polo não podia exprimir-se de outro modo que não fosse com gestos, saltos, gritos de espanto e de horror, latidos ou berros de animais, ou com objetos que ia extraindo dos alforges: penas de avestruz, zarabatanas, quartzos, e dispondo à sua frente como peças de xadrez. De retorno das missões a que o enviava Kublai, o engenhoso estrangeiro improvisava pantominas que o soberano tinha de interpretar: uma cidade era designada pelo salto de um peixe que escapava ao bico do albatroz para cair numa rede, outra cidade por um homem nu que atravessa o fogo sem se queimar, uma terceira por uma caveira que apertava entre os dentes verdes de bolor uma pérola cândida e redonda..." [Calvino, Italo, in As Cidades Invisíveis, 1965] Lugar num Passeio, que se diz[ia] Alegre... por entre o rio d'Ouro e o mar Atlântico, acolhido em setembro de 2005 pela Cidade do Porto: o *Era uma vez no Porto...* não foi contado, nem escrito por Marco Polo, nem traduzido por Kublai, mas podemos [bem] imaginar os símbolos que estes usariam para o descrever... Lugar de mil músicas, mil conversas, reflexões, mil revoluções, amizades, muitos mais amores, mil artes...


Ao nível do mar subiam-se uns degraus; uma sala familiarmente musical recebia os seus viajantes em ambiente aquecido, pronta a servir alguns apetites...


Durante 3 anos acolheu sonhos, em forma de tatuagens, bicicletas, brincos, batons, candeeiros, carpetes, vinis, livros, bonecas, tesouras de cabeleireiro, pinturas, vinho, fotografias, ilustrações, entre muitas outras, que se foram revelando, crescendo, multiplicando, e, também [não fosse este um lugar real], enfraquecendo e morrendo até.


Um certo dia, inevitavelmente, a declaração "a brisa do mar levou-me ao Centro de ti..." transportou o *Era uma vez no Porto...* para o lado mais urbano do coração da Cidade, em busca e em apoio de uma revitalização da Baixa que se anunciava. Ali se instalou, sob um olhar atento de uma Torre de Controlo - a bela e amada Torre dos Clérigos. "Grande responsabilidade", dizia quem espreitava da varanda e sentia, de imediato, o calor daquela que acolhia e recebia uma nova vida no seu tempo, mas também a atitude daquela que também vigia e supervisiona quem tem uma missão importante a cumprir....


Enquanto os ponteiros rodam... as histórias vão continuando a acontecer, as pessoas vão dançando, saltando, gritando, gesticulando, simplesmente comunicando.


Fica a memória, e os sinais que ela preservou, fazendo de todos nós um Marco Polo em modo de tradução.